terça-feira, 27 de abril de 2010

Memórias de Brian (capítulo 3)

Brian deixou o bar duas horas depois, ainda estava pensativo com aquela aparição de Valentine. Seguiu pela rua escura até uma pequena fábrica abandonada e subindo as deterioradas escadas chegou facilmente ao telhado, sentou-se e acendeu um cigarro –Maldito vicio!- praguejou enquanto deitava-se de costas.
Olhava as estrelas com um sorriso de satisfação, mas este sorriso morreu em seus lábios quando uma idéia passou por sua cabeça. Ao olhar aquele brilho tão intenso das estrelas lembrou-se que muitas delas já haviam deixado de existir à muito tempo, e sentiu-se da mesma forma, estava ali, interagia, mas há tempos tinha deixado de realmente “existir”.

Nesse ponto lembrou-se de quando ainda era “normal”. Estranho, mas sua memória estava voltando, ele sentia que a presença de Valentine estava fazendo isso. Lembrou de sua mãe, Cassiana, uma bela mulher, independente e cheia de vida, mas naquela época sofria com a discriminação por ter sido mãe solteira. Brian odiava o homem que deveria chamar de pai, seduziu sua mãe e depois a abandonou fugindo com outra mulher.

Mas Cassiana amou Brian desde o primeiro momento em que o sentiu dentro de seu ventre, era como se já o conhecesse de outras vidas, tinha um carinho todo especial e nunca demonstrava tristeza perto de seu querido filho. Eles moravam num casebre perto do bosque, uma casa cedida por pessoas que se apiedavam da situação da pobre mulher. Cassiana tinha muita sabedoria com relação a ervas e por isso diversas pessoas a procuravam em busca de cura para todo tipo de mal. Muitos a chamavam de bruxa e inventavam diversas histórias a seu respeito, Cassiana sofria com isso e o filho também.

Quando Briam começou a freqüentar o colégio sentia-se rejeitado e muitas vezes era surrado por um grupo de garotos que o chamava de filho do diabo. Brian foi ficando cada vez mais revoltado e começou a se isolar, mantinha-se afastado dos outros garotos apenas observando e estudando cada um deles, pensava em um dia se vingar.

No colegial algo aconteceu, uma garota vinda de terras muito distantes entrou na mesma escola que Brian, quando a viu sabia que a amaria até o fim de seus dias. Não tinha coragem de se aproximar, mas um dia andando próximo a uns rapazes cheios de más intenções escutou o nome dela sair da boca nojenta de um deles.

-É Ricardo, o nome dela é Sofia e eu aposto o que quiser que pego ela antes de qualquer um!
Brian não se conteve e sem pensar em mais nada agarrou o garoto pelo colarinho jogando-o contra a parede.
-Se ousar tocar num só fio de cabelo dela eu mato você!
Brian soltou o garoto que estava trêmulo com a reação daquele rapaz tão calmo. Achava até que Brian tinha alguma deficiência mental por ser tão afastado das pessoas, e agora essa manifestação tão bruta por uma garota que ele tinha certeza que o rapaz nem conhecia.
Os dias passaram sem que Brian dissesse qualquer outra palavra, vivia pelos cantos sondando a garota que já havia feito amizade com toda a escola. Às vezes ela olhava em sua direção e ficava a encará-lo, era como se os dois fossem imãs que se atraíam.
Um dia quando Brian chegou em casa pegou a mãe caída no chão, estava com a respiração fraca, segurava um amuleto e o apertava contra o peito.
-Brian...meu filho...- segurou o rosto do rapaz com as mãos- Acho que chegou a hora de eu lhe dizer algo sobre seu pai...
-Não diga nada mamãe, poupe suas forças, você vai ficar bem, vou cuidar de você.
- Não meu bem...eu estou partindo – os olhos do rapaz ficaram marejados- Eu preciso que saiba a verdade, você vai precisar disso para se defender.
Cassiana olhou para os olhos azuis do filho e com muita ternura acariciou seu rosto.
-Seu pai, Brian... seu pai não fugiu, ele continua nos vigiando...- tossiu respirando com dificuldade - Quando o conheci não fazia idéia do que ele era...mas depois veio a surpresa, depois que eu já estava grávida foi que descobri que seu pai...é um Vampiro Stirb Nicht...e ele me garantiu que virá atrás de você...
- Mas o que ele pode querer comigo mãe?
Depois de longa pausa Cassiana voltou a falar com dificuldade.
-Você é um deles, Brian... mas não está desperto, e eu o manteria assim por toda a minha vida, por isso quero que fique com este amuleto, ele manterá teu pai longe...
Entregou o amuleto ao rapaz e logo depois beijou suas mãos.
-Sempre estarei com você meu filho...
Depois disso caiu morta nos braços de Brian que sem ouvir resposta chorava soluçante enquanto perguntava o nome do pai.

Nenhum padre quis fazer o enterro da velha curandeira, julgavam-na uma bruxa e por isso não tinha direito a ser enterrada em solo sagrado. Pois Brian achou muito bom, não queria ficar longe de sua mãe e duvidava muito de toda aquela parafernália “sagrada” daqueles padres hipócritas. Enterrou sua mãe nos fundos da casa, fez para ela um belo arranjo de flores e ervas depositando sob o tumulo.

Ficou dois meses sem aparecer na escola. Quando voltou, as pessoas cochichavam e sentiam medo dele, até gostou dessa reação. Sofia estava ainda mais linda, com seus longos cabelos negros e olhos de um castanho profundo que o seduzia de uma forma mágica.
Naquele dia, Sofia se aproximou. Brian se assustou com a iniciativa da garota, os outros alunos ficaram horrorizados com isso, a garota chegou sorrindo.
- Oi, meu nome é...
-Sofia.- Brian respondeu secamente .
Sem deixar que esta atitude os afastasse a garota continuou animada.
-Isso mesmo, e você deve ser Brian. Muito prazer.- estendeu a mão.
Brian ficou pensativo, dentro dele um sentimento tão profundo de amor, ele não queria que ela se aproximasse, poderia ser rejeitada pelos colegas depois disso. Por isso fingiu não ver a mão estendida e ficou calado.
Sofia recolheu a mão sem graça, mas não se deu por vencida.
- Fiquei sabendo o que houve com sua mãe, eu sinto muito por isso.
- É melhor você ir embora, seus amiguinhos não aprovariam esta tua atitude.
Sofia franziu o cenho e respondeu rispidamente.
-Não preciso que me digam o que devo ou não fazer. Sabia que você era um cara difícil Brian, mas não tinha idéia do quanto! Porque me renuncia dessa forma quando sabe muito bem o que somos feitos um para o outro?

Deixou o rapaz e foi de encontro a seus amigos entrando direto na escola. Brian ficou sem saber o que pensar. Será que ela lia sua mente? Será que também sentia o que ele sentira desde o primeiro dia em que a viu? Seu coração começou a bater forte, já não se sentia tão seguro, sentia-se invadido, como aquela garota podia ter dito algo daquele tipo?
Resolveu não assistir as aulas e foi dar uma volta perto do riacho. Chegando lá viu uma figura sombria sentado próximo à uma enorme pedra. Aproximou-se com cautela. Mas antes mesmo de ver o rosto daquela criatura ouviu sua voz rouca.

- Até que enfim você apareceu Brian, já faz um bom tempo que não nos víamos.
O homem se virou e Brian fitou seus olhos vazios, parecia não ter sentimento algum.
- Quem é você e como sabe meu nome?
- Sou Lucius, seu pai.- estendeu a mão.
Quando Brian tocou a mão de Lucius vários corvos vieram sobre ele. De repente, o rapaz acordou daquelas lembranças, ouvindo o piar de uma coruja. Olhou ao redor, estava no telhado da velha fabrica. Quanto tempo havia se passado? Foi uma recordação bem estranha, como se tivesse de fato viajado até aquela época. Lembranças que há muito havia perdido, e agora Sofia vinha à sua mente juntamente com Valentine...
Que sensação esquisita!

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